O Rali de Portugal de 2007, por toda a envolvência e importância é a prova mais importante a que terei a honra de assistir, nos meus mais de 20 anos de acompanhamento da modalidade. A prova tinha entre os seus inscritos os melhores do mundo, e quem sabe se existirá outra oportunidade para assistir a um evento deste nível, pelo menos brevemente.
Os dias que antecederam o Rali de Portugal serviam para programar o “grande evento”. Primeiro foram os testes da Mitsubishi, da Skoda, Ostberg e Guy Wilks que serviram de “aperitivo”. Depois, a ânsia de programar um Rali de Portugal me fez desdobrar em contactos com alguns amigos, tentando planear o melhor possível. Mas todos os planos têm falhas, e como tal a programação foi alterada muitas vezes. Mas… começando pelo shakedown.
Manhã bem cedinho, amigo Márcio Charata passou com o 9TL (uma das “figuras” da prova) para seguir em direcção a Vale Judeu. Pelo caminho apanhamos o Valter e Pedro Correia, pois a carripana também servia de “minibus”. Chegados ao local o muito público, principalmente o espanhol, surpreendia pela moldura e apoio dado aos concorrentes após cada passagem. A malta do Fórum Ralis a Sul também “picava o ponto” e como tal não poderia faltar à chamada. Amigo Zé Correia e Márcio pregaram-me uma bela partida. Aproveitando a presença da reportagem da RTP, começaram com alto “escabaxe” a dizer que era madeirense e vinha da Madeira para a prova. De repente, ja tinha o microfone na frente, e só disse porcaria... coisas sem nexo. Provavelmente nem passou, mas foi uma bela partida para começar a prova.
A passagem dos primeiros WRC’s meteu a malta em alvoroço. Os andamentos eram impressionantes, e cada vez que aparecia uma viatura, era um autêntico espectáculo. Os aplausos apareceram, principalmente com as passagens de Armindo Araújo, Gigi Galli, Dani Sordo, e dos Ford oficiais. E foi Armindo quem mais deu que falar. Primeiro porque na segunda passagem efecutou um tête na Zona Espectáculo 2 e depois, devido ao malfadado acidente. A especulação não tardou a aparecer, e quando as piores notícias (com eventuais mortes) eram avançadas viveu-se um sentimento de tristeza e apreensão. Felizmente, quando a verdade veio ao cima, a “festa” continuou… Da caravana do JWRC o destaque ia para Josef Beres e Jaan Molder, que à falta de velocidade aliavam a espectacularidade. Mas “brutal” foi o estado em que ficou o Citroën C2 do Conrad Rautenbach… mais parecia uma C2 pick-up. Quanto aos portugueses, o primeiro contacto com os S2000 de José Pedro Fontes e Bruno Magalhães foi muito positivo. Mal podia esperar pelo “rali a sério”.
Para a parte da tarde estava programada a primeira especial – a Super Especial do Estádio do Algarve. Um traçado bonito, bem conseguido, e muito perto do público era do agrado de todos… apesar de ser em asfalto. Já com o “camarada” Raposo, acabadinho de chegar de Lisboa, a SE teve como primeiro chamariz a participação de veículos clássicos tripulados por alguns pilotos de outros tempos. E foi verdadeiramente espectacular, o Audi Quattro S1, Lancia Delta S4, o Peugeot 205 T16, o Ford RS 200 eram todos do meu imaginário, e tripulados por pilotos como Markku Alen, Bjorn Waldegaard e Ari Vatanen, ainda melhor. Apesar da contenção dos pilotos, pois as viaturas tinham valor elevado, e quase insubstituível, foi Vatanen quem mais cativou o público tanto com o Escort RS 1800, como com o 205 T16. Enfim, estava “nas minhas sete quintas”.
O Rali começou com uma dupla de pilotos interessantes – Eyvind Bryneldsen e o madeirense Bernardo Sousa. Apesar de torçer pelo meu conterrâneo, e saber que fez um grande resultado, reconheço que o norueguês foi superior. De seguida mais uma disputa interessante – Vitor Sá, representando a Madeira e Horácio Franco, pelos Açores. E logo eu e Raposão na bancada… Vitor Sá andou melhor, apesar de usar toda a pista, o mesmo será dizer deixar o para-choques do Impreza para trás. A última curva foi-lhe fatal. Um pequeno exagero o fez bater no muro, e perdeu para Franco. Resultado Açores 1 Madeira 0.
Finalmente, e graças à transmissão televisiva os WRC apareceram um pouco antes do previsto. Para começar um MacHale-Armindo Araújo. Tudo a puxar pelo português…e este perdeu. Pessoalmente acho que Armindo devia ter agradecido os aplausos em vez de ficar no carro ignorando o público. Ficou mal.
Um dos momentos mais altos deu-se quando Galli entrou no estádio, acenando ao público. Se as suas passagens já eram exuberantes, o espectáculo que se seguiu foi estrondoso. Andar em cima do carro com a camisola da selecção portuguesa – simplesmente inesquécivel. Depois as lutas Hirvonen-Sordo e Loeb-Gronholm foram emocionantes. Enfim, parecia um sonho.
A super especial correu bem.. até chegar o Troféu C2. Nessa altura já quase o estádio estava vazio, mas são pilotos os primeiros, como são os últimos …. E como quando participo também passo entre os últimos… acho por bem ficar até o final do show. A disputa entre Carlos Oliveira e Pedro Fins correu mal. Após o salto, Carlos Oliveira embateu no muro partindo uma transmissão e derramando óleo, e Pedro Fins também teve um despiste antes do salto, mas só deixou a viatura ao pé de Oliveira. E as coisas não corriam bem para a organização. Não conseguiam retirar os carros rapidamente, os reboques demoravam na remoção, e não arranjavam um balde de areia para limpar o oleo depositado na pista. O comissário “Carlinhos” é que ficou com as orelhas em chama...
Especial acabada, era tempo de partir para os troços. Primeiro passamos pelo Jumbo para comprar alguma coisa para comer, e gelo para o pessoal que tinha partido antes. Os planos ficaram furados quando o acesso à Malhada do Rico tinha sido cortado às 17:00, e não à meia-noite como tinha sido avançado inicialmente. Eu e o Márcio sozinhos, andavamos em permanente contacto com os “AutoCorreias”, e estes decidiram partir para a ZE 2 e 3, nomeadamente Alcaria do Cume. Como já era tarde, e não havia mapas, nem conhecia a região, esperamos pelo Zé Correia (que acompanhado pela Suzana) também decidiram partir nessa noite para a primeira especial.
Quase a chegar a Alcaria, amigo Zé decidiu experimentar um caminho alternativo para a Malhada do Rico. Nós o seguimos, não só para lá assistir à prova, mas também para posteriormente chamar os restantes elementos da comitiva. Zé tinha uma Nissan Navara 4x4, e as estradas não eram propriamente caminhos aceitáveis. O Renault 9 muito passou, e após nos apercebemos que andavamos perdidos, lá decidimos voltar para cima. Não sem antes voltar até Tavira… ou seja tivemos que subir novamente a estrada do Cachopo. Zé ainda atraveu-se a procurar outros caminhos (mais tarde vim a saber com sucesso), mas nós decidimos ficar pela Alcaria.
A chegar à zona das antenas, a GNR “barrou-nos a passagem” e ficamos na estrada. A atitude a tomar seria chamar os rapazes para que levassem o gelo, não fosse este derreter. Mas já separados, de que nos servia subir até ao “acampamento” se depois tinhamos que voltar para dormir no carro. A decisão foi encostar, comer algo e tentar dormir. Apesar do frio que se fazia sentir, dentro do carro até estava agradável, e o sono rapidamente se apoderou de nós… até às 3:00, quando com a sua “simpatia habitual” um guarda da GNR, (também conhecidos como FDP ambulantes), bateu com o cacetete na viatura para que “retirassemos, que estava em cima da linha branca”. Repito, grande FDP… Como se isso servisse de algo, outro iria ocupar o lugar, mas aquele cabrxxx fez-nos sair de lá. Levamos o carro para baixo, e cada vez mais longe do troço. Depois já tive alguma dificuldade em dormir. A constante passagem de pessoas, de policia, o frio, e o desconforto de dormir do banco, fez-me pensar se valeria realmente a pena dormir nos troços.
Manhã cedo, a “romaria” delocava-se para o troço. A local escolhido foi o topo da Alcaria, com visibilidade para grande parte da súbida, até à entrada no asfalto. Estava muito público, mas confesso, esperava mais.
Depois de uma noite muito fria e ventosa, o dia rapidamente tornou-se solarengo e muito quente. As passagens dos primeiros WRC’s foram brutais. Jari-Matti Latvala é que na zona do gancho, deixou o carro ir abaixo, e devido a problemas com o selector de mudanças perdeu uns 45 segundos. Depois dos WRC, os JWRC e restantes nacionais deixavam um pouco a desejar, embora existiam sempre alguns andamentos muito interessantes. Eu estava a tirar alguns tempos com o meu relógio-cronómetro e no final quase todos bateram certo.
Aproximadamente a meio do rali, assistiu-se a um alvoroço, ao pé das roloutes. Uma pessoa sentiu-se mal, e desmaiou. Ao pedir auxílio a um GNR – bigode farto e grande barrigaça, a resposta foi “Não posso fazer nada” (e ainda querem que goste destes “elementos da autoridade”). Obviamente, não foi uma resposta satisfatória, que mereceu contestação. Mas da parte do comissário responsável, também, nada foi feito. Um marshall que por lá andava, é que procurou entre o público algum elemento que pudesse ajudar. Três médicos apareceram, colocaram o individuo numa zona resguardada, e já reanimado esperava pacientemente por uma ambulância. Enquanto isto, sr.guarda permanecia de braços cruzados vendo o rali. Por tempo via a coisa preta para meu amigo “Estrelinha”. Exaltado barafustava quanto mais podia com o guarda, e numa troca de palavras, quando insinuou que se fosse para multar o “homem trabalhava”, a resposta foi peremptória – “Pode crer que sim!!!!!”. Os elementos da organização e o GNR já tinham todo o público contra eles, mas quando as viaturas do INEM apareceram é que as coisas ficaram negras. As duas ambulâncias que passavam quando o troço estava encerrado, entraram na escapatória do gancho, ou seja a 500 metros do local onde estava o “infeliz”, que teve o azar de se sentir mal. Em vez de sinalizar que era necessária a sua intervenção em cima, o GNR continuava quieto, de braços cruzados. E como me lembro… Estrelinha correu pela estrada abaixo mais depressa que alguns dos carros de ralis passaram para chamar os homens do INEM. A ambulância veio mais tarde, e pelo outro lado da estrada, mas “Estrelinha foi o homem do dia” – devia pensar correr os 500 metros a pique.
Entre as duas especiais ainda estivemos com a malta da AutoCorreia, que estava bem ressacada… depois de uma noite bem… bebida.
Quanto à segunda passagem…. Foi igual à primeira. Nada a acrescentar. Apenas a companhia do Estrelinha, Licinio e do Quim. Acabado o primeiro dia, decidimos descer para “a cidade”. Mas primeiro uma passagem pelo Parque de Assistência. Não para ver as viaturas, que a maioria já estava em Parque Fechado, mas para assistir a toda a envolvência. Exposições, feiras, assistências, marketing. Como um dia não são dias, lá comprei um gorro do WRC e uma miniatura do Sandro Munari.
Decidimos então descansar em casa, pois não há nada como a nossa casinha, e partindo a horas certas, assistiamos ao rali da mesma forma.
4:00 a pé, para 4:30 partir e desta feita mais dois membros. Raposão e Hélio Diogo integraram a comitiva da 9TL… grande máquina. O destino, a segunda especial do dia – Ourique. A razão escolhida, um conselho do Zé Teixeira no dia anterior. Mas quando chegamos ao IC1 não demos com o local apontando. Depois de questionar um elemento da autoridade sobre localizações sobre o rali decidimos deslocar para a ZE com acesso por São Marcos da Serra. E fomos dar ao mesmo local que assisti nos últimos dois anos. Chegamos cedo, e após analisar terreno, ou seja, andar às voltas à procura de um local interessante, decidimos ficar num dos topos da ZE. Era possível ver a viatura a aproximar, e depois a descida. A localização era interessante, mas o frio e a chuva estragaram um pouco os planos. Parecia que o dia estava estragado. Felizmente, após algum tempo, lá parou de chover. Nessa altura, os marshalls já não deixavam ninguém passar para o nosso lado. Umas “alminhas bem regadas” lá começaram a barafustar, e com alguns “piropos” à mistura. Acalmavam-se cada vez que aparecia um guarda. Passaram toda a primeira passagem a barafustar, mas ver rali, que era bom…. népias.
Da primeira para a segunda passagem, a “barriga deu horas” e foi o Hélio que nos salvou, pois “vinha bem abastecido de mantimentos”. Aparentemente, esquecemos de um saco de comida no supermercado.
Para a segunda passagem decidimos mudar de lugar. Desta feita, ficamos sentados no morro, de frente para a descida inclinada. Apesar de ser menor o tempo de passagem dos concorrentes, também era um lugar muito interessante. No meio de nortenhos, pareciamos "uns anjinhos"… eram de Guimarães, Amarante, Braga… enfim. O sol já batia, e havia quem quase dormisse. Amigo Raposo é que não deve ter achado piada à partida, de o deixarmos sozinho no morro.
Depois da especial e à semelhança do dia anterior, ainda demos uma voltinha pelo Parque de Assistência.
Ultimo dia de prova. Novamente às 4:30, Márcio passa por minha casa, apanhamos o Raposo, e seguimos para o IC1. Encontramos o Zé Correia (e Suzana) na BP e juntos partimos em direcção à ZE próxima do Malhão. Já lá estava muito público.
Ficamos num topo, com visibilidade para as viaturas que vinham do Estradão, e seguiam para a sequência de curvas em direcção ao Malhão. Sabiamos que só podiamos ver uma passagem, pois de seguida tinhamos que descer rapidamente para o Estádio, para não perder a última Super Especial.
E assim foi. Chegado ao Estádio, apanhei uma dor de cabeça. A organização decidiu fazer uma corrida de motos, no circuito. O barulho ensurtecedor já dava cabo dos tímpanos. Estava farto daquele show rídiculo. Ao mesmo tempo, a notícia na rádio do abandono de Armindo na penúltima especial, até parecia uma partida. Apesar de no Estádio ser falado baixinho sobre o abandono, alguns se questionavam sobre a veracidade, uma vez que era 1 de Abril.
A super especial começou, e Armindo não pareceu. A organização nada disse, nem os “speakers” de serviço. Apenas que Rui Madeira havia sido o melhor português. Quando ao espectáculo, foi mais fraco que no início. As viaturas estavam “cansadas” e visivalmente gastas. Pareciam pedir reforma. Novamente Galli pos o estádio em pé. Destaque para a cerimónia de entrega das taças (ainda com Gronholm e Hirvonen no pódio). Foi interessante, mas o espectáculo é que contava. Grandes aplausos para Bruno Magalhães, Aigar Pars (que ainda destruiu a frente do Swift S1600), Josef Beres, Eyvind Bryneldsen com um show de drift, e um salto espantoso, e para o Christopher Shean que festejou o finalizar a prova, como se de uma vitória se tratasse.
O Rali acabou, dúvido que para o ano haja, mas este foi muito interessante… não diria memorável, mas muito agradável.
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