A edição do Rali de Portugal foi uma das mais disputadas, com muito candidatos às posições cimeiras e alterações constantes no decorrer do evento. A vertente desportiva foi um sucesso, mas a prova também ficou marcada pela falta de público. Foi notado pelos espectadores, pela imprensa, pelos organizadores e principalmente pelos pilotos, que aludiram ao facto com alguma surpresa.
Analisando o sucedido, há que encontrar causas para este afastamento. Certamente não será apenas uma, mas um conjunto de variáveis que podem minimamente justificar a ausência destes importantes figurantes.
A localização da prova é apontada como predominante sobre as restantes. Reconhecidamente, o Algarve e Baixo Alentejo possuem um conjunto de características que permitem organizar um rali mediante os parâmetros exigidos pela FIA. Com um traçado muito interessante e compacto, do agrado da maioria dos concorrentes, localização turística com meios hoteleiros, destacando a proximidade entre aeroporto e parques de assistência, tem as características ideiais para uma prova do WRC. Mas falta a cultura do rali. É do conhecimento geral que a maior massa adepta, a “aficcion” dos ralis está no Norte. Foram mais de três décadas de ralis, com troços míticos. Tanto que também levavam a alguns exageros, com autênticas molduras humanas, conhecidas internacionalmente como os “toureiros”, que abriam mediante a passagem das viaturas. Ir ao rali foi um ritual repetido ano após ano, que passou entre gerações, que identificavam zonas de prova, como autênticos santuários: Arganil, Luílhas, Lameirinha, Fafe, Vizo ou Ponte de Lima. A saída em 2001, motivada pelas más condições climatéricas nesse ano, e também a uma “ajudinha” de bastidores, fechou um ciclo de um dos melhores ralis do mundial.
Mas também são adeptos diferentes. Adeptos que partilhavam de uma cultura do acidente, que não identificam o concorrente, e às vezes nem a viatura, mas que gostam do salto, do charco, e acima de tudo do acidente. No Rali do F.C.Porto, no salto de Fafe-Lameirinha, concorrentes como Armindo Araújo, Miguel Campos ou Bruno Magalhães foram apupados e vaiados. Aliás, os mais aplaudidos eram os do regional VSH, que davam espectáculo, mas também deixavam a “carroça” numa valeta.
No Algarve, apenas 2007, e com o WRC se recriou alguma dessa mística. Locais como Malhada do Rico, Alcaria do Cume, Cova da Muda ou Santana da Serra já fazem parte de um novo vocabulário. Alguns dos “amantes” dos ralis deslocaram-se a sul, aliados a muitos espanhois e fizeram uma bonita moldura humana, embora longe de outros tempos, mas que se assemelha à maioria dos ralis do WRC.
Uma disputa Norte-Sul só é válida quando os argumentos servem para melhorar o rali, e não para criar separatismos, que é o que acontece actualmente. A questão principal, e que já teve resposta negativa por alguns adeptos, é: Será melhor ter WRC em Portugal no Algarve? Ou não ter?
Outro dos pontos apontados é o excesso de zelo na segurança. Foram criadas Zonas Espectáculo, locais exclusivos destinados ao público, que parecem autênticos “currais”. Junto a estes estão colocados vários “marshalls” e/ou agentes de autoridade, que não permitem qualquer infracção, o mesmo será dizer que possam afastar ou mesmo tocar nas faixas delineadoras da zona. Infelizmente, estes locais por vezes não estão bem colocados, e não permitem uma boa visualização da prova, pelo que a procura de outros locais quase é impossível. O público gosta de ter alguma autonomia, na escolha dos locais. Neste parâmtero também destaco a falta de acessos ou o desconhecimento dos mesmos, que não beneficia a procura dos espectadores.
O facto da prova ser prontuável para o IRC, mesmo contando com concorrentes e equipas oficiais, não é tão atraente como uma prova do campeonato mundial. Nem para os portugueses, nem para os fâs estrangeiros, nomeadamente, os espanhóis, que apesar de presentes eram em número reduzido.
Também foram apontadas algumas falhas na promoção do evento, principalmente nos meios de comunicação genéricos. O destaque ao evento, foi dado a nível local, mas também através dos sites da especialidade na Internet. A Antena 1, Antena 3, algumas rádios locais, e a RTP também efectuaram um trabalho interessante, principalmente nos directos, que funcionou de duas formas: Para além de promover e divulgar a modalidade, também ajudou ao afastamento de alguns adeptos, que preferiram ficar em casa, “sentados no sofá” a disfrutar das cobertura em directo.
A conjuntura financeira actual dos portugueses também não é a mais favorável. Uma deslocação acarreta custos elevados, que necessitam ser calculados, a que se juntam a comida e dormida. A prova também calha num ano com muitos feriados, ou possíveis “pontes”, que influenciam na escolha do uso a dar a esses “ bónus”. Finalmente, os dois primeiros dias de prova disputaram-se em dias de semana em horário laboral. Não é possível sacrificar dias de trabalho para assistir aos ralis. No Sábado foi visível um aumento de público, proviniente de vários pontos do pais.
Outro pontos também tiveram influência, mas penso que o essencial foi referido. Não podia deixar de salientar o sucesso da Super-Especial. Realizada no centro de Faro, contou com uma moldura humana muito interessante, com mais de 10.000 espectadores. Não sendo uma lotação esgotada, ultrapassou em muito as expectativas, principalmente devido às dificuldades de acesso e à hora que se realizou: 18:00. Fica apenas uma chamada de atenção, para que se torne mais apelativo, os concorrentes deviam ter percorrido o troço em ordem inversa, permitindo aos espectadores atrasados acompanhassem os melhores concorrentes, a fim também de evitar a “debandada” para os concorrentes com número alto.
Para o próximo ano o Rali de Portugal volta ao WRC, mas também está incluído no Intercontinental Rally Challenge, existindo uma chance de regressar aos troços a norte do Tejo. Não será fácil, pois já tem 3 provas internacionais, uma delas como Event Support – Sata Rally dos Açores, que poderá aproveitar a situação para captar o IRC. Por outro lado, a aproximação do ACP a outros eventos da Eurosport, como o WTCC e o Transibérico poderá servir como escape a uma penalização pela não realização da prova portuguesa.
Acredito que o mundial regresse eventualmente a esses troços, mas já existiram muitas mudanças e a mística apregoada será nostálgica. Regressará uma nova vaga, diferente, que se adaptará aos tempos modernos.
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